Aos 19 anos, o alemão Alexander Megos firma-se entre os maiores talentos da escalada em rocha, botando pressão em nomes consagrados de sua geração, como Adam Ondra e Daniel Woods
Por Bruno Lazaretti
Mas o hipotético jornalista do parágrafo acima perderia de vista uma característica que dá força a Megos, assim como dava a Ondra no princípio de sua carreira: ele ainda é um menino. Essa é sua “chave”, pelo menos por enquanto. Megos é dono de uma ingenuidade e humildade típicas de heróis infanto-juvenis, capaz de desarmar quaisquer obstáculos que encare. “Eu não tenho nenhum desafio concreto em mente. Eu só olho para o que está a minha frente. Foi sempre assim”, revela Megos, em uma esquiva entrevista. Foi preferindo “não saber” que o alemãozinho, nascido na cidade de Erlangen em 1993, conquistou um currículo impressionante: aos 14, subiu em flash (logo de cara, com “dicas”) sua primeira via de gradação 7b+, a Freche Füchse (em Zamonien, na Alemanha); aos 15, também em flash, conquistou sua primeira F8b, a Commando Madrid (Mallorca, na Espanha); aos 17, já iniciava na ilha grega de Kalymnos sua impressionante sequência de onsights, a Trous dans l’Air (F8b+), a Barabuk (F8b+) e a Rendez with Platon (F8a+/b). Parece que quanto menos informação Alex tem sobre uma via, maiores são suas chances de dominá-la. “Ah, sim, há várias vias e boulders que não estou pronto para encarar. Listá-los seria tedioso. Mas uma coisa boa que venho notando nos últimos anos é que essa lista está diminuindo. E, frequentemente, acontece de eu não achar que estou pronto para uma via, mas ainda assim tentar e conseguir”, conta a Máquina Alemã. Escalar, para Megos, é uma pura viagem interior. Ele não divulga seus resultados (mesmo porque todo mundo ao seu redor se incumbe dessa tarefa), raramente comenta sobre graduações de vias e não encara a escalada como profissão – apesar de já contar com o apoio de marcas importantes de artigos outdoor, como a Patagonia.
Sua memória está repleta de satisfação com as conquistas mais recentes, como a via Shangri-La (8c+), na Alemanha, a The Fly (9a), nos Estados Unidos, e, claro, a Estado Crítico (9a), na Espanha. Mas sua lembrança mais intensa de escalada não está nas conquistas alardeadas mundialmente, mas em um campeonato local insignificante da cidade alemã de Munique, do qual ele participou com 13 anos, em 2006. “Uma coisa que ficou na minha cabeça foi a primeira competição fora de minha cidade, quando cheguei às finais. Estava nervoso como o diabo, porém consegui ficar em segundo lugar. Essa competição me marcou muito.” Assim é Megos: escalando consigo e para si mesmo, e guardando suas memórias a sete chaves. Por exemplo: quando subiu em onsight a Estado Crítico neste ano, Megos se apressou em dizer que não comentaria sobre o grau de dificuldade dessa via (os graus são subjetivos e podem mudar de acordo com as opiniões dos escaladores). Ele também se recusou a ver vídeos sobre a via antes de encará-la e, na verdade, subiu-a meio por acidente. “Meu plano era tentar a via La Rambla [9a+], mas eu não conhecia o lugar e estava sem um guia, então decidi tentar a Estado Crítico. Eu só sabia que um meu amigo teve que repeti-la no passado. Não fazia ideia de quem mais tinha tentado subi-la e se tinham conseguido de primeira”, diz ele. Se o alemão tivesse pesquisado sobre a via, descobriria que Adam Ondra e o californiano Chris Sharma, outra lenda viva do esporte, haviam deixado suas marcas ali. O primeiro tentou a via sucessivas vezes até conquistá-la, atribuindo-lhe o grau de 8a+. Já o segundo transformou-a para sempre: foi ele quem quebrou uma importante agarra da rocha e, inadvertidamente, elevou seu nível de 8a+ para 9a, já que não haveria mais esse pedaço de pedra para os escaladores usarem na ascensão. Em muitos sentidos, Alexander Megos está acompanhando os passos dos melhores escaladores do mundo. E sabe que vai melhorar. Quando indagado sobre as técnicas que mais penou para aprender, Megos lista os dynos (“botes”), os movimentos dinâmicos para superar um trecho da via, e os slopers (agarras arredondadas, sem saliências ou beiradas para que o escalador encaixe os dedos) como suas maiores dificuldades. E rapidamente emenda: “Não posso declarar que já dominei essas técnicas”. Mas ainda há muito tempo para isso, como ele mesmo admite. “Tenho quase certeza de que vou melhorar no futuro. Tenho só 19 anos!” Mas a escalada parece não ser o motivo de vida do jovem Megos. Ele repete que não quer fazer isso pelo resto da vida e que deseja se manter no esporte como um “simples hobby”. Mas que a gente não se engane: Megos é um entusiasta puro da escalada, um menino subindo pedras e se divertindo pacas com isso. Um garoto que usa exclamações em excesso e responde e-mails com emoticons. Quando pergunto o que é tão “do cacete” nesse esporte, a Máquina Alemã derruba a máscara e responde: “TODO CACETE DE COISA!!! Exceto escalada em velocidade ;-)”.
Pode ser que as pedras escorreguem por entre os dedos de Megos e ele nunca mais escale a página da frente das notícias de escalada. Se depender apenas de sua humildade quase infantil, a conquista onsight da Estado Crítico será a última notícia que teremos de Alex Megos. Há, porém, que se acreditar no contrário. Com sua ingenuidade e inocência, Megos tem tudo para se firmar para sempre entre os melhores escaladores do mundo. E o fará de olhos semi-abertos e seguindo somente um mantra, que ele classifica como o conselho mais importante que já recebeu de um escalador: “Não solte a rocha por nada!”.
(Reportagem publicada originalmente na Go Outside de maio de 2013)
DE PRIMA: Alex na via Estado Crítico, na Espanha
(Foto: Miguel Catita)
SE UM JORNALISTA FUTEBOLÍSTICO botasse os olhos em Alexander Megos, observasse seu método e provasse de sua angustiante economia de palavras, provavelmente apelidaria o rapaz de “Máquina Alemã”. E ele não estaria totalmente errado: Megos, 19 anos, encara as vias com pragmatismo germânico – para este prodígio da escalada, não há nome, não há graduação de dificuldade, existe apenas a rocha e o caminho até o topo. Foi com essa estratégia que Megos galgou rochas míticas. Sua mais recente e alardeada conquista foi uma onsight (quando o escalador chega ao local e sobe de primeira, sem “dicas” prévias sobre o percurso) da via Estado Crítico, a primeira onsight de gradação 9a do mundo. Assim, com garra e determinação, vem consolidando seu nome no panteão dos grandes escaladores de sua geração, como o tcheco Adam Ondra, de 20 anos, e o norte-americano Daniel Woods, 23.
FAZENDO POSE: O alemão também manda bem nos boulders
(Foto: Joseph Wetzel)
NA FENDA: Alexandre Megos escala em Utah, nos EUA
(Foto:Jorgos Megos)