Cleber Anderson estreia coluna sobre ciclismo


Pelotão: nada como uma estrada com os amigos (Foto: Marcirio Dias Leite)

Estamos em 2011, o penúltimo do calendário Maya, que finda uma era anunciando a próxima, a de Aquário. Enquanto uns caminham cada vez mais para uma espécie de “Matrix” ou “Blade Runner” totalmente cibernético, outros, mais sensíveis, abandonam a ciência cada vez mais específica e buscam algo global, relacionado a tradições como a dos chineses, pajés e druidas.

Uns só acreditam em exames e em resultados digitalizados vindos de enormes máquinas que “escaneiam” o sujeito que sofre a claustrofobia e a terrível ânsia de engolir à força um líquido extremamente sintético para que todo o seu corpo seja mapeado. Antes de chegar a esse ponto, porque não lhe perguntaram simplesmente se ele estava vivendo com felicidade ou quais e quantos sapos ele estava engolindo para estar ali procurando um médico?

Isso é uma visão mais ampla do que acontece hoje, quando a sociedade resolveu trocar o raciocínio pelo conteúdo e a sensibilidade pelos parâmetros. Traduzindo para o ciclismo e o esporte: atualmente muitos se voltam a ciclocomputadores modernos, com sensores de potência e cadência. São como nossos filhos adolescentes, que podem ficar o dia inteiro na frente de um computador. Essas pessoas se esquecem de sentir o que é um vento no rosto, um sol nascendo ou se pondo, o som da bike rolando e do vento soprando, a cinestesia da musculatura agindo, a busca do conforto no exercício e a higiene mental que o esporte proporciona. Nossa vida cheia de metas, horários e compromissos continua, enquanto deveríamos apenas curtir nossos preciosos minutos de paz e lazer enquanto pedalamos.

Se servir de dica – vinda de quem começou a pedalar aos 12 anos, na época em que não existia um cateye nem monitor cardíaco portátil ou muito menos um GPS ou um “Power Meter” –, lembro aqui que os profissionais, “turbinados” ou não, praticamente se condicionam nas competições. Eles nem precisam saber em que cadência, potência ou freqüência cardíaca estão pedalando na hora que outro cara ataca, forçando-o a pular na roda e entrar na fuga. Se essa fuga seguir até o sprint final, ele também não ficará pensando em nada a não ser em ganhar, pois deve ter a cabeça livre para focar na estratégia e na hora certa de atacar para a vitória. É dessa forma que pensa um profissional, suportando o que seria insuportável pelos parâmetros definidos por um fisiologista através de ciclocomputadores modernos. Da mesma forma, eles não precisam deles no dia seguinte à competição para “girar” horas e horas a fio até que as pernas estejam prontas novamente para mais um desafio.

Se você está começando e quer evoluir, desligue-se por um tempo dos sensores, dos monitores e pedale com o prazer de “socar a bota” quando der vontade e de girar sentindo o movimento mais preciso das pernas quando elas estão um pouco pesadas. Não fique o tempo todo olhando a porcaria do ciclocomputador, por mais simples que ele seja. Sinta a evolução a cada ciclo de seu treinamento. Minha sugestão: três semanas de sensibilidade (arranque tudo do guidão), para uma semana de monitoração via ciclocomputador. Os profissionais também seguem a ciência, mais é a ciência que aprende com eles. Eles usam todos os recursos da tecnologia, mais não pedalam “ligados” o tempo todo.

Antes de alguém te dizer o quanto pedalar, já te contaram como pedalar? Você sabe arrancar, “sprintar”, escalar, fazer curvas e depois retomar a velocidade? Você sabe descer uma montanha com rapidez e segurança? Você economiza energia em sua pedalada? Está ajustado perfeitamente a sua bicicleta? Sabe realmente andar num pelotão sem derrubar ninguém? Segue uma planilha de qualquer jeito ou respeita seu corpo se está num dia mais cansado? Da mesma forma, limita-se a uma velocidade se o vento está a favor e naquele dia a energia está lhe sobrando?

Tornar-se apenas um pupilo monitorado e bitolado não é evolução pra ninguém.

Boas novas pedaladas!

Cleber Ricci Anderson é um dos mais renomados experts em ciclismo do Brasil e, desde 1992, é proprietário da loja especializada Anderson Bicicletas (www.andersonbicicletas.com.br).







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