Polêmica na pista

Recentemente uma polêmica envolvendo o Velódromo do Rio de Janeiro, localizado na zona sul da cidade maravilhosa, veio à toa. Construído para o Pan-Americano de 2007, a pista não atende às exigências para receber as Olimpíadas de 2016 e corre o risco de ser demolido.

É verdade que, desde sua construção, já se sabia que o velódromo não possuia padrões olímpicos: tem poucos lugares na arquibancada, inclinação da pista inapropriada e pilastras que impedem a visão total dos árbitros. Mas não se esperava que ele tivesse de ser demolido.

Segundo o site do
Jornal Nacional, para os jogos de 2016 outro velódromo será construído na cidade. No projeto de candidatura do Rio, entregue ao Comitê Olímpico Internacional em 2009, a previsão era que o atual fosse reformado. Mas a Empresa Olímpica Municipal anunciou na semana passada que decidiu demoli-lo e construir um novo. Mesmo assim os envolvidos no caso afirmam que o velódromo, considerado o mais moderno da América Latina, não será desperdiçado por inteiro: a pista será remontada em outra cidade do país.

A discussão é polêmica e, por enquanto, os atletas que utilizam a pista torcem para não perder o espaço de treinamento.

Leia a seguir a reportagem publicada recentemente pela revista Go Outside sobre o projeto Movimento Liverwright, que espera formar futuros atletas de ponta e tem como palco de treinamento o Velódromo do Rio de Janeiro.

Em busca do tempo perdido

Modalidade ainda tímida no Brasil, o ciclismo de pista ganha projeto inédito para desenvolver novos atletas e fazer o país conquistar medalhas em futuras Olimpíadas

Por Maria Clara Vergueiro


FILHO ÚNICO: Ciclistas treinados por Dani Genovesi no único velódromo
coberto do país, no Rio

NO RIO DE JANEIRO, UM TIME DE 15 PESSOAS sonha acordado com uma medalha olímpica. O objetivo provavelmente se concretizará apenas em longo prazo, mas quando se trata de sonhos de tal porte o trabalho precisa mesmo começar cedo. Os jovens esportistas são os meninos dos olhos do Movimento Livewright, projeto de ciclismo de pista inédito no país que espera formar futuros atletas de ponta para fazer bonito nos Jogos de 2016.

Para isso, os ciclistas escolhidos estão dando duro, sem economizar esforços e dedicação para alcançarem suas metas. Entre os atletas do Livewright, está a paranaense Camila Coelho, de 22 anos. Moradora de Indaiatuba (SP), ela treina ciclismo de estrada e de pista há quase 15 anos. Em nome do esporte, decidiu adiar o casamento depois que seu então treinador a inscreveu no projeto, que tem sede na Barra da Tijuca. Foi selecionada, acabou mudando de técnico, de cidade, de casa e de equipe – apenas o noivo se mantém o mesmo. “Acredito que daqui a pouco terei experiência e maturidade suficientes para disputar os Jogos de 2016”, diz a moça, que descobriu a pista a partir do ciclismo de estrada, como quase todos dessa modalidade que nunca levou um representante nacional a uma Olimpíada.

Neste ano, o Brasil vai a Londres com uma delegação recorde sobre duas rodas: no total, são nove atletas, distribuídos nas categorias de estrada, BMX e mountain bike. A pista ainda estará vazia de brasileiros. E foi para mudar essa realidade que a ciclista carioca Daniela Genovesi começou a desenvolver o projeto, que conta com o patrocínio de duas grandes marcas do setor, a Caloi e a Shimano. Daniela, campeã na categoria solo feminina da mítica Race Across America (ultramaratona norte-americana de 4.830 quilômetros), passou cerca de dois anos desenhando os contornos dessa “escola”.

A ideia é aproveitar a estrutura do único velódromo coberto do Brasil, localizado no Rio, a experiência bem-sucedida de países como Inglaterra e Austrália e a garra de jovens promissores. “Procurei pessoas de 18 a 23 anos com vivência no ciclismo, não necessariamente com histórico na modalidade de pista. Aí misturei esses meninos e meninas a alguns atletas mais experientes, para que servissem de exemplo e ‘puxassem’ a garotada”, conta ela. “Recebi muitas indicações e analisei a história de cada um para compor o time. Tenho certeza de que faremos um campeão mundial na pista em menor tempo do que qualquer outra modalidade do ciclismo.” Foram também recrutados o treinador Álvaro da Costa Ferreira, para cuidar do dia-a-dia dos atletas, e o renomado técnico inglês Simon Jones, dono de dez medalhas olímpicas como treinador, para atuar na capacitação da comissão técnica e na orientação dos treinamentos.

Em julho deste ano, Simon virá ao país para acompanhar de perto o que até agora tem sido feito à distância. “Gosto muito da origem desse projeto, que de uma tragédia fez nascer algo com um potencial extraordinário”, comenta o técnico, referindo-se ao acidente aéreo que, em 2009, matou o empresário Roger Wright. Um dos maiores entusiastas da candidatura brasileira aos Jogos de 2016, Roger queria “criar heróis” que inspirassem e transformassem a vida de crianças carentes. Há um ano, outros empresários se uniram para fundar o Movimento Livewright, que também pretende desenvolver esportes como ginástica artística, tênis, atletismo, remo, vela e judô. O ciclismo de pista é a primeira aposta do movimento. “Queremos ter uma boa apresentação em 2016 e fazer um campeão mundial da modalidade daqui a seis, oito anos”, explica Daniela. “Se tivermos um ‘Guga’ da vida no grupo, o resultado pode até vir antes.”


PELOTÃO: O time todo reunido

Todos os alunos de Álvaro e pupilos de Simon têm as despesas com moradia, alimentação, transporte e saúde, além de equipamentos e uma ajuda de custo, totalmente bancadas pelos patrocinadores do projeto. Tudo para que possam estar focados em desenvolver apenas suas performances. “Nos dias em que trabalhamos resistência em estrada, os treinos começam às 7h da manhã e terminam por volta das 10h. Quando o treino é específico, começa às 9h e termina às 12h no Velódromo. Três vezes por semana, fazemos treinamento de força na academia do Parque Aquático Maria Lenk, que também fica na Barra da Tijuca”, descreve Álvaro, que tem 30 anos de experiência, sendo cinco deles dedicados a treinar equipes de ciclismo. Os atletas trabalham intensamente seis dias na semana, às vezes em dois turnos, têm somente um dia de descanso e são avaliados a cada seis meses para analisar a evolução no seu condicionamento.

Para Simon, todo o suporte em torno desses atletas – do treinador ao equipamento, dos mecânicos aos profissionais de saúde – é determinante para o sucesso futuro. “Entretanto, o maior desafio é não perder a determinação e entusiasmo nos momentos mais difíceis”, aconselha. “Por enquanto tudo é novo, mas um dia será apenas normal. É preciso identificar um objetivo constante para que o progresso se consolide e renove a motivação e o senso de que se está caminhando na direção certa.”

>> Corre, Brasil!
A Confederação Brasileira de Atletismo faz há anos um trabalho semelhante de desenvolvimento das categorias de base, com resultados muito positivos. Ela mantém mais de vinte Centros de Descoberta de Talentos espalhados pelo Brasil, voltados para crianças e adolescentes. De Pernambuco, por exemplo, veio Keila da Silva Costa, medalha de bronze no salto em distância no Mundial de Doha, em 2010. Além desses centros, o Programa Nacional Caixa de Jovens Talentos seleciona atletas com bons resultados e financia ajudas de custo que partem de R$ 400 e chegam a R$2 mil, de acordo com os resultados obtidos.