Missão (quase) impossível de melhorar o condicionamento físico do nosso repórter
Por Charles Bethea*
Fotos de Amanda Greene
Na final dos 1.500 metros dos Jogos Olímpicos do Rio em um bar, poucos meses antes do meu 35º aniversário, quando me passou pela cabeça, pela primeira vez, se existiria um corredor de média distância em algum lugar dentro de mim. Foi um pensamento estranho. Com 1,91 metro e 79,3 kg, tenho a aparência de um corredor – mas não as pernas de um. Quando eu tinha 20 e poucos anos, com um pouco de treino, sem fazer muito esforço, conseguia os tempos nada impressionantes de 22min39 nos 5 km, 1h49 na meia maratona e quase quatro horas na maratona. Geralmente, era uma namorada que acabava me incentivando a competir. Hoje, com meus 30 e tantos anos, estou lidando com uma grande dor nas costas.
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Ainda assim, a corrida de uma milha (1,6 km) me intrigava. Parecia curta e simples, e o tempo de treino seria muito menor que o necessário para provas de maiores distâncias (ou, pelo menos, era o que eu achava). Além disso, ultimamente, todo mundo corre maratonas, não é? Eu nunca havia corrido uma milha cronometrada. Nunca tinha sequer pisado em uma pista de treino. Meu melhor tempo nos 5 km sugeria que era possível correr uma milha em 6min30, mas eu não ia ter por que me gabar disso.
Correr em menos de seis minutos parecia algo comum, e em 5min30, muito aleatório. O recorde mundial do marroquino Hicham El Guerrouj, de 3min43, conquistado em 1999, estava certamente fora de alcance. Então decidi correr uma milha em menos de cinco minutos. Mais de 23 mil estudantes do ensino médio quebram a marca de cinco minutos a cada ano. Entretanto eu não tinha mais a idade dessa garotada.
Em uma manhã de agosto, em uma pista perto de casa, em Atlanta (EUA), eu calcei meu macio par de tênis New Balance e corri quatro voltas irregulares e muito cansativas, em 6min19. Pensei comigo, jogado na grama: “Nada mal”. Mas e agora? Um atleta que fazia corridas de uma milha na faculdade me disse para “treinar até conseguir correr 400 metros em 74 segundos com o pé nas costas”.
Atlanta é insuportavelmente quente no verão, então comecei a correr meus 400 metros (que correspondem a um quarto de milha e uma volta na pista de corrida) na esteira. Eu programei a esteira para 12 milhas por hora, que equivale a um ritmo de cinco minutos por milha, e tentei aguentar durante 1h14. Depois de pouco tempo, consegui. Mas levei dois meses para correr com confiança os quatro segmentos no mesmo treino. E tive que intercalar corrida com descanso.
No início do inverno, eu havia perdido as poucas reservas de gordura que tinha e ganhado mais confiança e resistência física. Eu me saía bem em uma meia milha difícil de 2min30 na esteira. Em um dia gelado em meados de novembro, fui correr na mesma pista onde havia feito minha primeira prova contrarrelógio. Meu amigo Will, dono de um recorde nos 5 km no ensino médio (16min20) há 17 anos e com 13,5 kg menos, juntou-se a mim. Assim como nosso amigo Wyatt, de 28 anos, que tenta correr uma milha em menos de cinco minutos todo ano.
Eu comecei com força total, correndo os primeiros 400 metros em 66 segundos (um ritmo de 4min24 por milha!) e o segundo trecho de 400 metros em 73 (ainda abaixo de cinco!), antes de diminuir o ritmo abruptamente, conforme o ácido láctico inundava minhas pernas ansiosas. Cruzei a linha de chegada 16 segundos depois de Wyatt, em 5min15. Will chegou ofegante, meio minuto depois. Após a corrida, eu mal conseguia ficar de pé e tossi durante dias.
Eu havia conseguido eliminar um minuto do meu tempo de corrida de uma milha em três meses e meio, porém estava claro que eu precisava de ajuda para obter uma vantagem competitiva. Para minha sorte, Nick Willis, da Nova Zelândia, duas vezes medalhista olímpico em provas de 1.500 metros e que ganhou o bronze nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, concordou em me treinar. Ele estava começando a oferecer um curso intensivo online para treinos de uma milha, chamado Miler Method. Nick montou um plano de cinco semanas para mim, com quatro semanas de treino, sendo duas focadas em resistência e outras duas em velocidade, e a semana final com dois treinos em ritmo-alvo.
E deu certo! Correr em percurso plano iria diminuir de três a quatro segundos do meu tempo, de acordo com Nick. Também por sugestão dele, eu comprei um par do sofisticado tênis Adidas Adizero Takumi- Sen 3. O neozelandês me disse ainda que minha intensa primeira corrida em 5min15, feita sem orientações, era prova de que eu tinha a velocidade necessária para correr em menos de cinco minutos, desde que aprendesse a controlar meu ritmo. A má notícia, segundo ele, era a de que eu precisaria correr muito mais, uns 48 km, para adquirir mais resistência. Correr muito pouco é um erro comum que novatos cometem, e quem compete em provas de uma milha tem uma propensão maior a esse tipo de mancada (leia o quadro “Pista rápida”)
“Você acha que sou velho demais para conseguir?”, perguntei.
“É senso comum, há muito tempo, que estamos em nossa melhor forma por volta dos 25 anos”, respondeu Nick. “Mas, na última década, temos visto uma tendência real de pessoas superando esses limites.” Em outras palavras, minha idade não era desculpa.
Eu segui o plano cuidadosamente, que incluía trotes leves de 8 km duas vezes por semana, uma corrida de 16 km por semana, uma tempo run de 5 km em ritmo de 6:15, treinos em subida e sprints de 100 e 200 metros. Apesar de fazer quatro ou cinco refeições por dia, eu baixei meu peso para 75,3 kg. E, com a benção de Nick, defini uma data para ir atrás da minha meta, no início de janeiro.
Com muito café e nervosismo, cheguei à pista de um colégio da minha região em uma tarde nublada. Eu tinha ouvido uma música de R. L. Burnside com um ritmo hipnótico naquela manhã e tentei ficar nesse ritmo enquanto fazia um trote de uma milha para aquecer. Conhecendo minha tendência de começar com tudo, Nick havia me dito para tentar correr de forma mais relaxada na primeira volta e manter um ritmo uniforme ao longo da prova, tentando fazer com que minha última volta fosse a mais rápida.
Eu me contive na primeira volta: 76. Depois 73, e outros 76. No fim da terceira volta, minhas pernas sentiram os sinais do peso do ácido láctico que chegava enquanto me mantinha próximo da raia interna. Eu conseguia sentir o gosto metálico do sangue na minha garganta e me esforcei para respirar. Porém eu sabia que faltava só pouco mais de um minuto para eu alcançar minha meta.
Ao chegar à reta final, segundo um espectador que se divertia, eu estava emitindo ruídos guturais audíveis e parecia “um pouco confuso”. Eu não me importei. Com as minhas últimas energias, corri ofegante até a linha de chegada e apertei o botão “pare” no meu relógio: 4min59s4. Talvez tenham sido as endorfinas, mas eu juro que ouvi 23 mil alunos do ensino médio torcendo por mim.
*Reportagem publicada originalmente na edição nº 153 da revista Go Outside, julho de 2018.