A experiência de uma brasileira viajando sozinha

Por Thaís Valverde

Em uma das últimas vezes que encontrei Lanna Dogo, minha amiga e também jornalista, reparei no quanto ela é uma pessoa adaptável. Ela foi no dia da minha mudança de apartamento. Lanna não conhecia ninguém que estava ali me ajudando no meio de caixas e bagunça. E eu sempre me preocupo em fazer as pessoas se interagirem. Mas com Lanna não foi difícil. Foi eu virar as costas e elá já estava no maior papo com a minha família. Talvez seja essa uma importante característica dela, e fundamental para ela conseguir viajar sozinha, de carona e usando couchsurfing pela América Latina.

Lanna está na estrada desde dezembro. A aventura começou quando ela pegou um ônibus na rodoviária do Tietê, em São Paulo, rumo a Montevidéu no Uruguai. O objetivo de Lanna, que nunca viajou sozinha, era conhecer a “tão desconhecida América Latina a fundo”. Hoje ela está na Guatemala, na cidade de Flores, e já passou por 12 países.

Lanna em Cabo Polonio, no Uruguai

Viajar de carona não era algo que estava nos planos de Lanna. Mas ela logo aderiu no primeiro dia de viagem incentivada por outra brasileira que conheceu no Uruguai. “O melhor da carona é não saber o que te espera. Conheci pessoas incríveis na “carretera”, gente que até me ofereceu teto no fim da carona e eu aceitei. Caminhoneiro que jogou meu nome no rádio local pra outros me ajudarem, famílias viajando e ajudando quem estava sem transporte, de tudo”, conta.

Já o couchsurfing, a hopedagem gratuita em casa de locais, a jornalista decidiu para conhecer a cultura com nativos da região. “Quem te hospeda conhece os melhores lugares pra visitar que não são turísticos, vai querer te ensinar sobre todo o país, vai te ensinar espanhol, te mostrar inclusive onde comer bem e barato, vai perguntar muito de você. É uma troca de curiosos.”

Lanna acredita que nunca teria aprendido tanto sobre os países da América Latina se não estivesse conversando com locais e tentando aprender com eles. “É tanta informação e tanta coisa que faço no dia que eu sinto que minhas 24h são 72h.”

Sobre os melhores momentos da viagem até agora, ela escolheu “as melhores pessoas”: carona com um coveiro no sul do Peru que tinha uma visão muito interessante de vida; uma família de Santiago que a convidou para passar o Natal com eles; a Páscoa com uma família de 50 pessoas numa cidade chamada Guaytacama no Equador; cinco dias num barco no Caribe com um grupo e andar de moto por cinco dias com um couch estão na lista.

Mas a solidão também bateu durante a viagem. “Um dos momentos mais difíceis foi estar completamente sozinha no meu aniversário, uma data que eu nem me importava no Brasil, mas chorei por não ter ninguém pra me dar um abraço”, conta.

Para aliviar as emoções, Lanna diz que sua “válvula de escape” são as músicas e a comida brasileira. “Nada que um dia de cantar português em voz alta, fazer arroz fresquinho, fazer um mimo da sua própria cultura para dar uma recarregada na mente e poder continuar.”

Lanna conheceu muitas mulheres de outras nacionalidades viajando sozinha e sempre conversam sobre como é a experiência. “Não são tudo flores, todas concordamos. Às vezes entramos em quartos compartilhados pra 12 pessoas e 11 são homens. Infelizmente, muitos deles falam com você na esperança de rolar alguma coisa, principalmente porque você está sozinha. Isso nos incomoda e muito”, explica.

O assédio também é algo comum pela América Latina. “Muitos homens ficam mexendo com as mulheres na rua, e isso é muito difícil porque estamos sozinhas e claro que ficamos com medo. Isso gera o “não posso sair de noite, não posso voltar tarde, não posso isso, não, não” e prende as viajantes dentro de onde estejam ao invés de ir por aí explorar.”

Mas apesar das dificuldades, Lanna não trocaria a viagem sozinha por ter companhia 24 horas. “Quero inspirar outras mulheres a fazerem o mesmo, afinal, esse mundão também é nosso.”

Pedi algumas dicas para quem deseja se aventurar assim como a Lanna pela América Latina – mas vale para outros lugares do mundo:

1. Não planeje muito, você vai mudar o roteiro tantas vezes que vai desistir de olhar a sua lista de lugares pra ir e só se deixar levar.

2. Tente olhar para os lugares e culturas sem preconceitos ou “no meu país é melhor, assim ou assado”, porque pra você é, pra outros não. Quer ver? Fala que no Brasil fazemos vitamina de abacate com leite e açucar, todos ficam horrorizados!

3. Escute os locais, pergunte tudo, eles querem falar de como vivem e querem saber de você.

4. Não abandone o medo, ele é o melhor companheiro de viagem que te manterá atento a toda e qualquer possível enrascada.

5. Não subestime seu limite, respeite-o. É necessário uns dias bobos sem muitos planos pra recarregar as energias e deixar o corpo recuperar do que seja.

6. Aprenda o básico da língua local, não custa nada e você vai fazer muita gente sorrir só por tentar.

7. Não coloque na mochila nada além do necessário, suas costas agradecem.

8. Esteja aberto pra perrengues, eles virão e podem ser boas histórias no futuro.







Acompanhe o Rocky Mountain Games Pedra Grande 2024 ao vivo