Mensagem nas garrafas


MARINHEIRO: David também pega no pesado a bordo do Plastiki

Por Maria Clara Vergueiro

Foto por Luca Babini

DAVID ROTHSCHILD É O TIPO DO CARA que impressionaria quase qualquer moça. Bonitão, barbudo, milionário e idealista, este inglês poderia ter escolhido passar o resto da vida trabalhando no banco do pai, às voltas com as oscilações da bolsa e com investimentos astronômicos. Mas ele fez diferente: escapou do estereótipo, e aproveitou a boa reputação e o nome famoso para investir numa boa causa. Montou uma equipe para construir o Plastiki, um veleiro feito com quase 12 mil garrafas pet, e se jogou na aventura de atravessar o Pacífico a bordo da sua criação. Em 20 de março deste ano, a tripulação deixou São Francisco, na Califórnia (EUA), rumo a Sydney (Austrália) com o objetivo de chamar atenção para a poluição dos oceanos e o uso excessivo das embalagens descartáveis.

David já navegou metade da rota de 17.700 quilômetros e espera dar continuidade à missão ativista do Plastiki quando a viagem estiver concluída. Independentemente dos resultados práticos que uma empreitada como esta pode alcançar, a ideia de David serve, no mínimo, para pensar nesse problema ambiental. Afinal, cerca de 2,5 milhões de garrafas pet são jogadas no lixo a cada hora só nos Estados Unidos, informa o site da expedição (theplastiki.com). Do meio do oceano, ele conta à Go Outside, por e-mail, como tem sido a viagem


GO OUTSIDE Como você avalia os últimos dois meses de expedição do Plastiki?

DAVID ROTHSCHILD Nosso foco é a poluição dos oceanos e aquilo que podemos fazer para reduzir nossa pegada no que diz respeito ao uso dos plásticos descartáveis. O Plastiki é um projeto que pretende conduzir à inovação, ao lado da consciência, procurando soluções para os problemas que estamos discutindo. Reutilizando o plástico no próprio veleiro, estamos criando uma metáfora, chamando atenção para a mudança e convocando as pessoas para que realmente empreendam suas próprias viagens desbravadoras. Não precisa ser uma ocupação permanente na vida. Pode ser uma aventura incrível, pode ser apenas divertido e pode realmente contribuir para enfrentarmos os impasses com os quais estamos lidando, a partir das soluções que temos disponíveis.

A viagem está saindo de acordo com o previsto?

Tudo está correndo de maneira bem tranquila, sem maiores problemas a bordo. A última perna foi levemente mais lenta que o esperado, mas agora estamos no curso outra vez. O Plastiki tem superado as expectativas e tem todas as condições de chegar a Sydney.

O que acabou saindo diferente?

A primeira perna levou mais tempo do que a gente esperava, por causa da mudança no clima, e por isso tivemos que mudar o nosso padrão de uso da água potável. Assim, quando descemos nas Ilhas Christmas [no Oceano Índico], procuramos armazenar água suficiente para que toda a tripulação ficasse bem hidratada quando a gente estivesse nos Trópicos. Isso é muito importante para a saúde e segurança de todos no barco.

Por quais ilhas e comunidades a expedição já passou?

Acabamos de deixar as Ilhas Christmas e Line, que são fantásticas. Não apenas reabastecemos o Plastiki, como também conhecemos a comunidade e compartilhamos nossas experiências de viagem até agora. Fizemos palestras nas escolas locais e visitamos projetos ambientais para aprender sobre os desafios que essas ilhas enfrentam.

Quem esteve a bordo do Plastiki com você nesses meses?

Na primeira perna, tínhamos o capitão Jô Royle, o co-capitão David Thomson, o cinegrafista Vern Moen, o neto de Thor Heyerdahl [o primeiro a fazer a rota, em 1947, que o Platiki está fazendo agora], o cinegrafista da National Geografic Max Jourdan e eu. Nesta segunda perna, a tripulação manteve, além de mim, Jô Royle e David Thomson a bordo, e ganhou a presença do fotógrafo Luca Babini, de Graham Hill (do site Treehugger.com) e do cinegrafista Singeli Agnew (da National Geographic).

Que obstáculos vocês enfrentaram até agora?

Durante a primeira perna, nós só conseguimos pescar três peixes em 40 dias, enquanto em 1947, na expedição Kon-Tiki de Thor Heyerdahl, eles comiam peixe em todas as refeições e não podiam entrar na água por temerem os tubarões. Nós até agora não vimos nenhum. Os enjôos também foram bem difíceis de contornar nos primeiros dias, mas consegui me acostumar e parece que já posso me considerar quase um capitão de verdade.

Algum evento surpreendente?

A absoluta beleza do céu à noite e das estrelas enquanto viajamos.

A expedição tem inspirado novos projetos?

Estamos constantemente inspirados pela natureza e temos muito tempo para pensar enquanto navegamos. Temos tido muitas ideias pelo caminho.

Que lições importantes vocês já aprenderam com essa viagem?

Que a lista de soluções é maior que a lista de problemas e que nós temos um grupo incrível de pessoas promovendo mudanças que vão fazer a diferença positivamente não apenas no meio ambiente, mas no nosso dia a dia.

O que vocês esperam fazer depois que o Plastiki chegar ao seu destino final?

A comunicação e a conexão com o mundo exterior são vitais em todos os aspectos. Isso é importante não apenas durante a expedição, mas quando terminar, para que a gente possa continuar a nossa mensagem; ir lá e dizer para as pessoas o que vimos, contar nossas histórias pessoais, dar continuidade ao blog, aos textos, vídeos, opiniões – tudo o que puder gerar um bom debate sobre soluções para os problemas que a gente está tentando combater.


(Reportagem publicada originalmente na Go Outside de junho de 2010)







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