Remada da vez


POSE PARA FOTO: Os 17 paddleboarders que conseguiram completar os 13 quilômetros entre Mar Grande e Salvador

Por Mario Mele

Fotos por Bianca Martinez

A REMADA É UM DOS FUNDAMENTOS básicos do surf. Braçadas consistentes – de joelhos ou deitado, usando apenas mãos e braços como propulsão – permitem ao surfista varar a zona de arrebentação para se posicionar no outside e esperar as ondas. Mas além de ser um pré-requisito do surf, remar sobre a prancha é também um esporte independente, bastante conhecido no Havaí e na Austrália: o paddleboard, que este ano ganhou uma prova no Brasil: a Travessia Mar Grande-Salvador, que aconteceu dia 12 de janeiro na Bahia.

O desafio reuniu 25 surfistas que remaram 13 quilômetros em mar aberto. Por causa da forte correnteza, apenas 17 competidores concluíram a prova, entre eles Bruno Pitanga, o primeiro a atracar em Salvador com o tempo de 1h10min. Bruno é um conhecido surfista local de 34 anos que foi apresentado ao paddleboard recentemente. “Sou iniciante, mas estou treinando para não fazer feio na Molokai To Oahu Paddleboard Race”, diz ele, referindo-se à disputa havaiana que acontece anualmente no mês de julho e que é considerada a Copa do Mundo da modalidade. “Já estou correndo atrás de patrocínio para viabilizar minha viagem ao Havaí”, conta.

Sabe-se que o paddleboard começou a ser praticado na primeira metade do século 20 pelos surfistas havaianos. Duke Kahanamoku, o pai do surf moderno, e Rabbit Kekai, uma lenda viva das ondas, eram dois caras que pegavam suas enormes e pesadas pranchas nos dias de flat e se acabavam em longas tardes de remada, apenas pelo prazer do contato com o mar. Conseqüentemente, quando a ondulação dava sinais de vida, eles eram os primeiros a mexer os braços e a descer, em pé, os enormes paredões d’água havaianos.

Na Austrália, o paddleboard também já é uma prática difundida. Nas praias, cada posto de salvamento tem um pranchão à disposição,

usado para auxiliar num eventual resgate. Lá, a evolução do esporte já pode ser notada no paddle surf, uma espécie de surf de joelhos.


NA LARGADA: A disputa ainda era perelha

É da Austrália o “Pelé” do paddleboard, Jamie Mitchell. O salva-vidas de 30 anos levou essa história de remar na prancha bem a sério e na última edição da Molokai to Oahu não só se consagrou hexacampeão da prova como bateu o próprio recorde. Jamie percorreu os 58 km do atribulado corredor de Kiwi, entre as ilhas de Molokai e Oahu, em 4 horas, 48 minutos e 23 segundos, diminuindo em meia hora sua marca de 2006.

O fato do australiano ter superado o próprio tempo tão significativamente não implica, necessariamente, que os braços dele estavam mais fortes ou sua técnica mais apurada. É claro que Jamie se dedica tanto quanto um atleta profissional de qualquer outra modalidade, mas, no paddleboard, assim como em tantos outros esportes náuticos, os competidores estão sujeitos às condições do mar e do clima. Vento forte e movimento da maré são os dois fatores que mais influenciam na velocidade e no rendimento da remada. Em 2007, Jamie certamente teve essas variáveis a seu favor para ter deslizado com tanta velocidade pelo canal havaiano.


BEM NA FOTO: Não foram só os homens que remaram suas imensas pranchas no mar baiano

No Brasil, o paddleboard deu seu primeiro sinal de vida em 2006, no Rio Grande do Sul. Uma remada de 4 km no entorno da Ilha dos Lobos foi uma das atrações do Torres Beach Festival daquele ano. Mas é Maurício Abubakir, surfista e shaper baiano que inclusive já morou no Havaí, quem está possibilitando o crescimento do paddleboard no país. Foi ele quem organizou a Travessia Mar Grande – Salvador, na qual chegou em segundo lugar, cinco minutos atrás de Bruno Pitanga. Além disso, Maurício é o responsável pela fabricação de pranchas específicas para a prática do paddleboard no Brasil. “Em 2000, conheci o [big rider e shaper havaiano] Dennis Pang, quando ele saía da baía de Waimea depois de ter remado num dia flat. A prancha que ele usava na ocasião tinha 14 pés de comprimento e se projetava na água como um esquife”, lembra Maurício, que há 34 anos constrói pranchas de surf.

De volta ao Brasil, Maurício se aprofundou nos estudos de hidrodinâmica para construir pranchas de remada cada vez mais leves, velozes e com boa flutuação. Os modelos podem variar de 13 a 19 pés e custam a partir de R$ 2.200. Depois do campeonato na Bahia, as encomendas aumentaram consideravelmente. Seu próximo desafio agora é tornar a Travessia Mar Grande – Salvador um evento anual. Parece que o paddleboard por aqui finalmente está deixando de engatinhar.

(Reportagem publicada originalmente na Go Outside de março de 2008)







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